Eu vejo um dia branco, vejo árvores magras com folhas presas
por tênues fios, um bocado de neblina e três pardais. É domingo, estou sozinha.
Eu, deitada no banco do parque, usando minha echarpe
vermelha, como alívio para o pescoço. Ergo a cabeça pra trás, machuca um pouco,
parece que vou rachar. Mas vejo um mundo novo, ameno e de ponta cabeça. Quebra-cabeça.
Quebro a cabeça. E não reajo. Estive colocando um pouco de alma em tudo que vi na semana,
mas hoje, hoje é domingo. Estou sozinha.
Estou levemente resfriada, respiro mal, escuto mal, esses
tempos loucos de inverno e solzinho bom, sabe? Tudo tão singular. Os tempos de
cobertas quentes e roupa pouca. Propício para um chá, um filme, um vinho quente
e companhia. Mas hoje, hoje é domingo. Estou sozinha.
Parece que há mais gente nesse parque, quando cheguei não
havia nada além dos guardas nas entradas laterais. Olhavam-me em confusão,
dentro dos meus olhos, indagando "moça?". Não respondo, não hesito,
apenas continuo. Olho fixamente para frente, sem visão periférica, sem direção.
Mas agora estou deitada, desconfortavelmente, e escuto vozes
que gritam. Algo que eu não entendo, mas sei - estão histéricas. Chegaram crianças no parque. Chegaram alguns adultos também, e os pássaros
estão cantando estridentes. Há confusão e barulho. É domingo, há muita gente por perto.
Mas estou sozinha.
Alguma coisa além das folhas cai das árvores, não sei
exatamente o que é. Observo calada, com os olhos meio cerrados, prendendo a
visão pra corrigir a miopia. Mas nada além se revela. Parecem alucinações, a neblina entorpece
alguns sentidos meus e tudo parece meio turvo. Embaça. Há imagens mentais se
desmanchando em partículas de água. A cerração lutando contra o corpo, um pra me
esfriar, um pra me aquecer.
Não há perplexidade. Aceito o transtorno em silêncio. Não há
cor nem dor. Há um branco leitoso - do céu, e há a minha pele branca - de neve.
Não há tristeza. E não há o que chorar. É uma dança fúnebre. Tudo está sincronizado, o dessabor com
a dissonância. As crianças estão cantando, os adultos falam, vez por outra
gritam em tom repreensivo. Imagens que não vejo. Continuo deitada, metade da
echarpe vai escorregando para o chão. É nova, macia, aveludada, vermelha. É a
única cor que preenche essa desordem. Já não estou mais tão desconfortável quanto
antes. Estou mais desconfortável que antes.
Mas continuo deitada. Não há reparo. É um domingo fúnebre.
Estou sozinha.
E não há mais o que fazer.
lindo, isa... acredite
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