domingo, 5 de janeiro de 2014

Calango e Caatinga

Luto pela sobrevivência. Senão, não luto. Só vivo, só-rio e mar. Mas sobrevivência é coisa séria, é o pesadelo do sertão no calor impiedoso. Pudera ele ser palco somente de saliva e suor. É quente a noite negra, estrelada. Mas ao dia, ao longo dia, ao meio-dia, essa luta por si só já está perdida.

O Sol que amanhece são, é o mesmo que cintila arrebol ao cruzar a Terra. Racha chão, seca açude e faz búfalo relinchar até morrer. E morreu, caiu e causou estrondo. Parecia até trovoada. Houve chuva sim; mas fora sangue saltando entre a poeira, em que tudo é cegueira, tudo é o nada. Até que se assentem os grãos de barro ressequido.

O Sol que é rei, é ressentindo e genioso. Quente. Misteriosamente atraente e temido. Até hoje, não soube se perdeu ou ganhou fechando o solo com tanta violência. A terra, que está mais para agreste, já esteve viva e alagada em mangue, já foi úmida e viçosa floresta; Bio-diversidade. Nem há pretexto pra castigo. Quem implica contigo são as matas de concreto! Mas o mesmo imponente Sol está selado a reflexões, se fazendo de louco, ou se fechando um pouco. 

A resposta está na atemporalidade? Se deixa entrar ele entra. Mas se fechar a porta e não deixar, ele entra também. Mesmo esquecido, a memória é vasta. Ignora os limites de espaço e tempo. Qualquer microporo é fresta boa. Para uma boa festa.

Festejo bom seria se esses fossem só raios do amor. Só amor. Mas há aspereza e ressentimento, há voracidade. Eu morreria de amor por esse Sol. Mas no sentido figurado da coisa. O Sol, irracional e insensato não processou bem as ideias. Mandou ver, matou mesmo. Só restou o solo rachado e um calango sassarico findando pé entre crânios de boi e cactos, ex-verdeados.

Tudo deu errado; Paciência. Sobrevivência é a arte de sob (o mesmo teto e chão) persistir na caatinga e  ainda viver.